Já passava das 21h quando uma forte trovoada, acompanhada por ventos e chuva fortes e queda de granizo de dimensões consideráveis se abateu sobre a cidade de Chaves e algumas aldeias limítrofes, no passado dia 21 de junho.
O primeiro dia do verão ficou marcado por uma das maiores tempestades de que há memória na região. “Tenho 78 anos e nunca tinha visto nada assim. Parecia o fim do mundo”, afirmou Manuel Cunha, acrescentando que “bastou meia hora para dar cabo do trabalho de um ano inteiro”. Como tantos outros agricultores do concelho, também Manuel Cunha viu algumas das suas culturas ficarem destruídas pela intempérie. “É um cultivo pequeno, só para consumo próprio, mas ainda assim é triste”, concluiu.
Para além das culturas, várias casas, garagens, lojas, oficinas, edifícios públicos, sofreram também com a fúria da natureza na passada quinta-feira, num total de cerca de 40 ocorrências comunicadas à Proteção Civil. Houve ainda registo de automóveis que estavam estacionados na rua e que ficaram parcialmente submersos, queda de muros devido à força da água e do vento, e ainda a queda de um poste de alta tensão, deixando casas sem eletricidade por algumas horas.
As urgências do Hospital de Chaves foram também afetadas pela tempestade, no entanto, os serviços nunca pararam de funcionar. “Algumas pessoas com a quantidade de água que viam na rua começaram a levantar tampas de saneamento, a encaminhar as águas pluviais para o coletor de saneamento que não comporta este caudal e começaram a saltar tampas, quer nas ruas, quer no caso das urgências do Hospital, tendo provocado ali uma inundação, pese embora eu ontem, por volta das 23h, tenha estado nas urgências do Hospital e eles mantiveram as urgências abertas e a funcionar”, explicou, na passada sexta-feira, o vereador municipal Victor Santos, responsável pela Proteção Civil.
Na manhã de sexta-feira os lojistas limparam os seus estabelecimentos e deitaram fora tudo o que ficou estragado. Na Rua Direita as caixas de sapatos amontoavam-se, e na Rua das Longras foi possível ver um comerciante de eletrodomésticos mudar temporariamente a sua loja para a rua pois a água arrastou lama e folhas e sujou toda a loja, para além de ter danificado vários eletrodomésticos que estariam colocados no chão do estabelecimento.
Crianças não puderam almoçar na escola
Um dos edifícios mais afetados foi o Centro Escolar de Santa Cruz Trindade. A chuva fez cair parte do isolamento interior da cobertura da cantina e do pavilhão deixando estes espaços alagados. “Houve a queda de algumas placas resultante da pressão da água porque houve significativa infiltração. Por razões de segurança esta zona foi interditada. Não teve aqui a frequência de alunos e, nesta medida, teve de ser encerrado o refeitório e não puderam fazer aqui as suas refeições cerca de 300 alunos tendo sido encaminhados para casa”, esclareceu Nuno Vaz, presidente da Câmara Municipal de Chaves, na sexta-feira. Em declarações aos jornalistas, o autarca flaviense aproveitou ainda para deixar “uma nota de agradecimento e de compreensão às famílias, aos pais, aos avós, aos tios, que recolheram as suas crianças e desta forma criaram aqui uma solução que seria a mais fácil de encontrar do que qualquer outra medida”.
O refeitório esteve vedado, mas a cozinha deste estabelecimento escolar continuou a funcionar, e, deste modo, as escolas e jardins de infância que são servidos por esta cozinha tiveram as suas habituais refeições.
Também a Escola Secundária Fernão de Magalhães teve corredores inundados e viu uma parte do teto de um corredor ceder.
Apesar da força da chuva, do vento e do granizo, e de todos os estragos causados por esta tempestade, não houve quaisquer vítimas a lamentar.
Rasgados elogios à rápida intervenção dos bombeiros e Proteção Civil
Durante a noite de quinta-feira estiveram no terreno as três corporações dos bombeiros do concelho flaviense (Bombeiros Voluntários Flavienses, Bombeiros Voluntários de Salvação Pública, e os Bombeiros Voluntários de Vidago), bem como os Bombeiros Voluntários de Boticas e os Bombeiros Voluntários de Montalegre.
“Temos de dar aqui uma nota de agradecimento e de valorização do trabalho dos bombeiros, que foram incansáveis, que conseguiram num curto espaço de tempo resolver muitas situações sobretudo no que diz respeito à extração da água em caves, em lojas, em edifícios públicos”, sublinhou Nuno Vaz. O edil destacou ainda o trabalho realizado pela Proteção Civil: “Uma palavra de agradecimento também ao responsável municipal, ao vereador responsável por esta área, o engenheiro Victor Santos, que andou no terreno toda a noite a avaliar efetivamente os danos”.
Depois da tempestade… vem o pedido de ajuda dos agricultores
Na cidade de Chaves houve grandes danos em vários estabelecimentos comerciais, habitações e edifícios públicos, mas na periferia e nas aldeias limítrofes os estragos mais significativos foram ao nível da agricultura. Os residentes de Outeiro Seco, Vila Verde da Raia, Santo Estêvão, Faiões, Eiras, São Julião, Madalena e Samaiões viram os seus cultivos arrasados pela intempérie. Plantações de tomate, milho, trigo, batata, entre outras, ficaram completamente destruídas com a queda de granizo, e vários terrenos ficaram alagados com a forte chuva que caiu copiosamente, sentindo-se impotentes perante a força da natureza.
Na passada segunda-feira, dia 25, Nuno Vaz fez-se acompanhar pelo Diretor Adjunto da Agricultura e Pescas do Norte, Adelino Bernardo, numa visita à Veiga de Chaves, na freguesia de Santo Estêvão, para verem bem de perto os estragos causados pela tempestade.
“Quisemos fazer esta deslocação ao local, juntamente com os serviços agrícolas, acompanhados pelo senhor Diretor Adjunto da Agricultura e Pescas do Norte, sobretudo na zona da Veiga que foi a zona mais afetada, para tentar perceber efetivamente, primeiro, qual é a dimensão do prejuízo, percebendo também quais são as culturas que foram mais atingidas, e por outro lado, também junto de alguns agricultores perceber exatamente se neste momento já é possível avaliar de uma forma rigorosa aquilo que são os prejuízos efetivos”, referiu Nuno Vaz.
As culturas de Tiago João, jovem agricultor desta freguesia, fizeram parte desta visita. “É um ano de trabalho perdido, basicamente. Alguma cultura vai recuperar, mas há culturas, como os cereais de inverno, que estão perdidos”, lamentou.
Uma vez que esta é uma zona considerada problemática no que respeita a inundações, os agricultores não têm quaisquer seguros sobre as suas colheitas. No entanto, existem apoios dados pelo Estado português, nestas situações, como explicou Adelino Bernardo: “O granizo e as chuvas abundantes são causas seguráveis em que o Estado português financia em 60%, o que é uma boa ajuda”.
Tiago João espera que o Ministério da Agricultura possa efetivamente disponibilizar verbas para o ajudar, e também aos outros agricultores, a fazer face aos prejuízos: “Espero bem que nos venha ajudar de alguma forma, porque é muito complicado. Já viver da agricultura é muito difícil, e agora ainda mais com este vendaval que passou aqui pela Veiga de Chaves”.
Não é ainda possível contabilizar todo o prejuízo causado por esta tempestade, mas estima-se que o valor seja elevado.
Autarca elogiou força das gentes flavienses
Os flavienses não baixaram os braços, e o presidente do município de Chaves teceu rasgados elogios ao seu povo pela forma como enfrentaram esta intempérie e os estragos por ela causados: “Os flavienses, enfim, os transmontanos estão habituados às adversidades e, portanto, não é naturalmente esta adversidade que poderá por cobro à sua energia, à sua vontade de fazer bem e melhor porque o que nós percebemos da cidade foi que logo pela manhã os comerciantes estavam a fazer limpeza, as arrumações, as substituições, abriram portas e, portanto, apesar do dano que tiveram, quiseram encarar mais um dia com normalidade e quiseram olhar para este dia com energia, porque só assim efetivamente se pode vencer”.
Maura Teixeira
“Apoios aos agricultores de Chaves que viram as produções agrícolas destruídas pela forte intempérie”
No seguimento da intempérie que causou estragos significativos no concelho de Chaves na passada quinta-feira, dia 21, nomeadamente ao nível da agricultura, Maria Manuela Tender, Deputada da Assembleia da República, do Grupo Parlamentar do Partido Social Democrata, enviou, na sexta-feira, dia 22, um documento ao Governo, através do Ministro da Agricultura, Florestas e Desenvolvimento Rural, com as seguintes questões:
1 – Já determinou o Governo proceder a um levantamento exaustivo dos prejuízos causados por esta intempérie ocorrida na noite de 21 para 22 de junho no concelho de Chaves?
2- Pondera o Governo declarar, nos termos e para os efeitos da Lei nº 27/2006, de 3 de junho, a situação de calamidade pública para estas freguesias do concelho de Chaves afetadas pela intempérie e consequentemente mobilizar os instrumentos necessários?
3 – Tenciona o Governo disponibilizar um apoio financeiro de emergência a todos os agricultores afetados por esta intempérie, de forma a minorar os prejuízos decorrentes da destruição das infraestruturas de produção agrícola e a apoiar a reposição do potencial produtivo, nomeadamente através dos atuais programas comunitários em vigor (PDR 2020 e VITIS)?
4 – Pondera o Governo a possibilidade de criar uma linha de crédito direcionada para os produtores mais afetados pela intempérie que tenham que repor o potencial produtivo?
5 – Equaciona o Governo tomar medidas que visem minorar o impacto desta tragédia que afetou tantos cidadãos do concelho de Chaves, nomeadamente a possibilidade de isentar os produtores agrícolas afetados por esta intempérie de contribuições para a Segurança Social durante um determinado período de tempo?